quinta-feira, 17 de junho de 2010

A OPÇÃO IBÉRICA - I -

 

( IBÉRIA   …OU HISPÂNIA ?        -        Memória - 2001 )

Quando um português desavisado se mete a fazer comparações, em directo, entre Portugal e a Espanha, acaba fatalmente por cair nas mais incorrectas ilações, ...chegando mesmo a atingir aspectos de completo ridículo.

Nós não somos piores ou melhores que os outros povos peninsulares. ...Simplesmente estamos sozinhos! ...Enquanto que os outros tiveram a sensatez (E o mérito) de se unir!

...Portugal deve sim ser comparado com as outras Nações Ibéricas, de dimensão e importância mais ou menos próximas das suas, (Castela, Catalunha, Andaluzia, etc) ...e nunca com a União!

...É notório que se alguém, em qualquer momento, se atreve a dizer que “Portugal é, geografica e demograficamente, uma Nação (Ou um Estado) da Espanha”, …ou que o Português é uma das principais línguas dessa mesma Espanha (Ou da Hispânia)”, logo ali é excomungado! ...E com certeza contestado, mais ou menos neste tom: “Não Senhor! Isto aqui não é Espanha, nem Hispânia, nenhuma! ...Isto aqui é Ibéria!”

...Bom, Ibéria, Hispânia e Espanha são todas a mesma coisa. Ibéria veio do grego, Hispânia é o nome latino, e muito mais moderno. ...Espanha será a alteração para o romanço. ...Mas talvez seja até melhor escolhermos Hispânia (Ou Espanha), porque a Ibéria era mais para a região leste da península, chamada agora Catalunha, embora mais tarde se passasse a chamar Ibéria à Península toda. E o nome provém de Ibero (Rio Ebro), que corre lá daquele lado.

Outra coisa que costuma dizer-se é que Portugal nasceu da Lusitânia.   ...Mas parece que pouco temos a ver com esse povo .    ( Ou povos - Eram onze tribos independentes entre si.)   ...A capital da Lusitânia era Mérida. ...E os lusitanos tinham sido também um povo germânico (Ou indo-europeu ) invasor, como os celtas, mas ainda mais antigo.  …E só chegaram aos Montes-Herminios a fugir do general romano Galba.

Também nunca houve confirmação de serem os Hermínios  a  nossa Serra da Estrela, onde jamais foram encontradas ruínas de castros, e os poucos vestígios existentes parece serem de construções "Tapori".

...A verdade é que Portugal nasceu da Galiza,   …e mais de mil anos depois da pacificação dos Lusitanos, dos quais já ninguém guardava memória.        A Galiza  era  ao tempo a mais evoluída e culta das nações da Espanha  (Depois da Andaluzia, claro, porque essa, sendo de cultura árabe, estava alguns séculos mais avançada). ...O Condado (Portucalense) era o pedaço sul da Galiza, nas margens e foz do rio Douro. ...E Portugal, desde que reconhecido pelo Papado, em 1179, esteja certa ou errada essa opção, nunca deixou de ser independente.

( ...Independência que se manteve até mesmo sob os reinados dos Philipes.  Pois que o II de España se chamou I de Portugal, e assim até ao fim da Dinastia ).

...Mas essa Independência, que todos nós queremos conservar, nada tem a ver com a  “Confederação Ibérica”!   ...Que não nos traria qualquer perda de Nacionalidade ou de Patriotismo, pois que continuaríamos a ser a Nação Portuguesa ...e "Patriotas dos Quatro Costados", ...só que com certeza mais fortes e menos pobres.

...Infelizmente essa União Ibérica continua a não estar sequer à vista!

...Entretanto, se Portugal fizesse parte dos "Estados da Espanha" (ou Hispânia), ...seria o Maior e o Mais Populoso.  Também o que teria os Maiores e Melhores Portos de Mar (Para além de serem naturais) - Com Sines como Porto de Baldeação da Europa –.  Os Melhores Percursos dos Rios (Que poderiam tornar-se realmente Navegáveis), as Melhores Praias (Que passariam a ter verdadeiro “aproveitamento Turístico”, para além da sua "beleza natural"). …O mais fácil Acesso Marítimo ao Resto do Mundo ! ...etc.  etc.  etc.

...Portugal poderia até tornar-se no Mais Importante dos Estados da Espanha!

...Assim, como estamos, ...somos   ...A Outra Andorra da Espanha!   ( Mas mais pobres! )

...Pelo seu lado a Espanha, com Portugal, seria o maior País da União Europeia, com importância semelhante à da França, Reino Unido ou Itália, e população muito aproximada à desses Países.

...Quase todos os Estados Europeus depressa descobriram que só as Uniões lhes dariam Força e Prestigio internacionais:  É a velha divisa  "A União faz a Força".

Assim a primeira terá sido a França, quando os Francos se juntaram aos Gauleses e Povos do Midi. ...Na Grã Bretanha uniram-se os Normandos aos Anglos, Saxões, Bretões e Scots.   ...A Itália, enfraquecida e toda retalhada,  …pelo impulso dos "unificadores", Garibaldi, Cavour, Manzoni, Verdi, transformou-se no portento que hoje é. ...E a Alemanha que, sob o pulso de Bismarck, resultou da ligação da Prússia aos Estados do Oeste e do Sul, e se tornou no País que agora conhecemos!?

...Os próprios Estados Unidos da América do Norte são o que o seu nome diz: UNIDOS.      (...Para o conseguirem sofreram a terrível Guerra da Secessão, ...mas Valeu a Pena! E são hoje em dia a Super-Potência do Mundo porque tiveram a inteligência e a coragem de se UNIR.)

...Porque é que fomos capazes de manter Unidos todos os Estados do Brasil e aqui, pelos séculos fóra, vamos insistindo neste divórcio de "nuestros ermanos", que tanto nos sacrifica?

...Enquanto que eles, ali ao lado, veja-se o Prestigio de que  agora desfrutam!

E, se nos uníssemos, para não ferir susceptibilidades , até poderíamos chamar ao todo Confederação Ibérica. …Ou simplesmente  IBÉRIA.    …E Portugal cá continuava!

Por vezes objecta-se que a Espanha é uma Monarquia, …e Portugal uma República.

…Mas, segundo o Professor A. M. Hespanha, na sua História do Portugal Moderno - Politica e Institucional, citando António de Sousa Macedo, diz-nos que as Monarquias podem, naturalmente, conter repúblicas, nelas integradas como uma parte pública das nações. …De resto estamos convencidos de que o Português, por  índole  e discernimento, continua a ser monárquico.                          …Pois que vincadamente o era a quando da implantação da república. …E só por um despropositado erro essa implantação aconteceu.   …No Porto espalhou-se que a revolução tinha ganho em Lisboa, …e em Lisboa parece terem conseguido o contrário.    No resto do País proclamou-se a república   …pelo telégrafo.  

…A convicção dos republicanos era tão pouca, que o Chefe da Revolução, Almirante Reis, suicidou-se na madrugada de 5 de Outubro,  convencido de que a República estava derrotada..

Portugal em oito séculos de Monarquia CRESCEU, quase até ao infinito.

Com um único século de República DIMINUIU, até quase desaparecer.

De resto, não é a Espanha uma Democracia ?

E não é Democracia um sinónimo de República ?

Porque é que o 25 de Abril concedeu aos portugueses a escolha da sua forma de Governo, …e não lhes facultou também a escolha da sua forma de Estado ?                                                                                   

Bastaria uma pequeníssima alteração à Constituição:  Em vez de “Eleição para Presidente da República”,  passaria a dizer-se “Eleição para Chefe do Estado”.  …E assim, além dos candidatos republicanos,  poderiam  também concorrer candidatos monárquicos;   Bragança,  Bourbon,  ou outros.                                 

E estaria reposta a  moralidade. 

Entretanto continuamos com o maior receio de que a “maioria nacional” goste disto é tal como está:   Pequeninos, pobrezinhos, atrasadinhos,  mas     …orgulhosamente SOS.

 

Nov. 2001

J. Sá-Carneiro (*)

 

(*) José António de Sá Carneiro

Despachante da Alfândega de Luanda de 1952 a 1975

Despachante  Ofic. da Alf. de Lisboa desde 1980

Diplomado em Marketing Management pelo SAMA de Joanesburgo

Licenciado em História pela Universidade Aberta de Lisboa

Nasceu em Lisboa em 1927

terça-feira, 15 de junho de 2010

ADEUS EUROPA. …BEM-VINDA IBÉRIA !

 

É  COM A  MAIOR  CONSTERNAÇÃO  QUE   NOS  SENTIMOS  OBRIGADOS   A  RECONHECER  QUE,  APÓS  DOIS MIL ANOS DE HISTÓRIA,  MAIS UMA VEZ,  A  TÃO  ALMEJADA  CONSTRUÇÃO  DA  EUROPA…              

…JÁ VOLTOU,  PROVAVELMENTE,   A  FALHAR !

          …RESTA-NOS  O  REGRESSO  À  “IBÉRIA” !

Desde já, encarecidamente, vos pedimos que não nos tornem a falar em “soluções miraculosas” para um Portugal isolado, sem  um mínimo de recursos naturais, com uma população que não consegue de modo algum sair do seu “circulo de fatalidade”, o qual não lhe consente  instruir-se porque é demasiado  pobre.         …E  que, por outro lado,  continua a ser cada vez mais pobre porque não tem  instrução.    

… A verdade é que, mesmo com gente  de melhor qualidade, e com  mais imaginação para  tirar  algum proveito das miseráveis condições que nos rodeiam, Portugal, sem  colónias, e isolado  do resto da Espanha,  nunca poderá ser viável.                                 

Por favor:   Não brinquem mais connosco !

                                           _____________

Vão uns dez anos, iniciámos uma série de pequenos artigos, sem “valia politica” de maior,  nem qualidade literária, em que  se tentava demonstrar que Portugal, uma vez que, após a revolução de 1383 e  a batalha de Aljubarrota,  havia cortado laços com Castela e todo o resto da Espanha,  …só tinha conseguido sobreviver, atravessando os mares,  e instalando-se em posições “do outro  lado”.         …Mas que agora    …já não havia    …“o outro lado”.

Esses artigos destinavam-se a ser publicados no jornal “O Dia”,   onde  escreviamos  às vezes,  e que  entretanto foi extinto,  pelo que nunca vieram à  luz.   Porém, os raros  amigos que os leram, por pouco não nos matavam.   …E fomos forçados a concluir que, no fundo,  gostavam era disto tal como estava:     Um Portugal      Pequenino, bonitinho,  pobrezinho, mas  “separadinho”.                 

Depois começámos a acreditar que a União Europeia  iria resolver todos os nossos problemas,     …e não se pensou mais nos tais artigos.

                                       _____________

…Longe de nós alvitrar “quem terá feito falhar a Europa”!…

Mas, passado este intervalo de dez anos, em  que a maioria das pessoas  já se apercebeu da realidade que nos cerca  e,  perante o falhanço, já quase definitivo, de todos os nossos geniais “Planos Europeus”,  parece que só nos resta  em consciência,   procurar  esses textos dispersos, talvez perdidos e,  agora com a facilidade da Internet,  passar mesmo e decididamente,   a  publicá-los.

O  Primeiro desses artigos escrevêmo-lo a 19 de Março de 2001, e é, com ligeiras alterações, este  que se anexa.                                       

Chamou-se “Ibéria  …ou  Hispânia?  –  Um  Ensaio  Iberista”.   

Passa agora a chamar-se:  “A Opção Ibérica”.                                  

Facultámos cópias dele  (Bem como, mais tarde,  dos outros 5 ou 6 que o  seguiram)  a dois amigos, que os terão estudado e adaptado nessa altura.     Foi já publicado,  há uns meses,  neste mesmo Blogue.

Para servir de inicio à pequena série, tornamos agora a emiti-lo, com ligeiras alterações,  sob o título de  “A  Opção  Ibérica  -  I  -“ 

Claro que tais artigos, este e os outros, não valem grande coisa,    …mas é o nosso contributo.        …E talvez ajudem!                

Afinal por algum lado teremos que SAIR! 

J. Sá-Carneiro

quarta-feira, 9 de junho de 2010

ANGOLA CRIOULA

                                                                                             ( MEMÓRIA)

ANGOLA CRIOULA - I

- Terá sido em 77 ou 78. Meia dúzia de refugiados portugueses, de Angola e Moçambique, à conversa num café de Joanesburgo. O José Ramalho, ex-redactor, creio que do “Noticias” de Lourenço Marques, e que estava na altura a trabalhar numa revista sul-africana chamada “To the Point”, preguntava-me porque é que o Savimbi chamava à Jamba “Capital da República Negra de Angola”. Claro que eu não sabia, ...mas fui alvitrando que talvez fosse por Angola não ser ainda...“Negra”, ...embora independente. ...Perguntou-me o que seria então Angola. Respondi-lhe que, a meu ver, Angola estava a caminho de voltar a ser crioula. “Crioula” como na verdade já tinha sido, no tempo colonial, e talvez como definitivamente acabasse por voltar a ser.

- ...Mas afinal o que era isso de “crioula”?

- Tenho um velho dicionário, intitulado “Thesouro da Lingua Portugueza”, da autoria do Dr.Frei Domingos Vieira, editado no Rio de Janeiro em 1873, que diz que “crioulo é o homem ou mulher brancos, originários das colónias”. Também diz que “negro crioulo é o nascido na colónia, em opposição ao proveniente do tráfico”.

O Larousse diz que “crioulo” ( creole ) é “Pessoa de raça branca nascida nas colónias”.

A Enciclopédia Britânica define “creole” como o termo que e usava, do Sec. XVI ao Sec. XVIII, para indicar pessoas brancas, nascidas na América Espanhola, filhas de pais espanhois.

O dicionário norte-americano Funk & Wagnalls diz que crioulo é um descendente de colonizador francês ou espanhol, da Luisiana ou dos Estados do Golfo e que mantém os seus especiais dialecto e “cultura”. Diz ainda que “Creole State” é o nick-name da Luisiana.

Sabemos que pelo correr do Sec.XIX se passou a chamar tambem crioulo ao africano negro que falava e escrevia o português ( Ou francês ou castelhano ) e, naturalmente, aos mestiços resultantes das duas raças. Passava assim o termo “crioulo” a definir e caracterizar uma determinada “cultura”, em vez de qualquer conceito de “raça”.

- Mas em 1942 quando, com 15 anos, cheguei a Luanda, teve esse vocábulo para mim muito mais impacto e significado que todas estas definições meio abstractas. “Crioula” era a população angolana ( branca, mestiça ou preta ) de expressão portuguesa, que constituia a maior parte da comunidade civilizada das cidades e vilas da colónia.(Brancos nascidos lá, muitas vezes de várias gerações, mas tambem outros que para lá idos em crianças, tinham adquirido o sotaque e os modos e mentalidade dessa extremamente gentil comunidade)...E ser crioulo era um modo de estar na vida. Era fazer parte duma “Cultura” muito especial, detentora duma sensibilidade e dum encanto, que só podia ter florescido dentro da Cintura dos Trópicos. Os crioulos de Angola seriam ao tempo um milhão. Na sua maioria de raça negra, cláro. A restante população da colónia estava ainda, a vários estágios, no caminho desse processo de assimilação. ...Mas eram crioulas muitas das familias, a que felizmente tive acesso       ( brancas, mestiças ou pretas ) mais consideradas de Luanda           ...Nunca vi ninguém receber melhor em sua casa!      ...E, quando se abeirava o fim do ano, disputavam-se os seus convites para as festas de Réveillon. ...Meu Pai, chegado um ano antes, explicava-me todo aquele esquema social. Dizia-me que Cabo Verde não era a única colónia portuguesa crioula. Que também Angola o era, embora aí se falasse um português muito mais próximo do europeu do que o dialecto caboverdiano.

Dizia-me ainda que essa população crioula, se um dia Angola viesse a ser um País independente, seria a sua grande vantagem face a qualquer outro estado africano. ..Levou-me ao que chamou a Capital Crioula de Angola - Benguela - , onde havia muitos senhores brancos casados com senhoras pretas, mas o contrario tambem ali com frequência acontecia.

- Voltei a Benguela pelo final de 1991 e passei o Réveillon no Sporting.

...O cenário social era exactamente o mesmo que eu conhecera cincoenta anos antes.

 

ANGOLA CRIOULA - II

É evidente que havia outras comunidades civilizadas em Angola naquele tempo. A dos funcionários públicos em comissão de serviço, por exemplo: o caso de meu Pai. Mas a aproximação era extremamente fácil, e assim me foi possível beneficiar das duas culturas, o que ainda hoje considero das melhores benesses que a vida me deu.

...Mas essa maravilhosa Cultura Afro-Portuguesa, que tinha feito o Brasil e que tão característica e vigorosamente se fazia sentir quando conheci Angola, estava condenada, sob as vagas sucessivas de neo-colonos dos anos 50 e a ocupação militar dos 60 e 70, a quase se extinguir. Pouco a pouco foi-se diluindo. Os seus mais caracteristicos representantes foram desaparecendo, e esse tão simpático “modus vivendi tropical” foi-se quase por com-pleto submergindo. ...Como lingua, não chegara sequer a ser um dialecto, ...mas era um português dum muito peculiar sotaque, doce e cantante. ...Era “música”! ...E já quase que não se ouvia falá-lo. ...Como Cultura? ...Não me será fácil expressar essa cultura crioula, muito mais de sentir do que de compreender, ...que, para alem da nossa de portugueses, nos dava acesso a outras regiões do entendimento, ...que nos transportava a uma espécie de “euforia lúcida”, ...que nos levava a um melhor relacionamento com tudo e com todos e a achar que, à nossa volta , todas as coisas e todas as situações eram fáceis e perfeitamente naturais.

...Raças? ...Acho que ninguém falava de raças naquele tempo. ...Ou se falava era sem acinte nem maldade. Toda a gente se ajudava. ...Se o branco era “paternal”, ...juro-vos que isso não iria de modo algum ofender o preto, antes pelo contrário.  ...Ninguém era estúpido!

E a posição inversa também se verificava: Eu, por exemplo, posso dizer que fui tratado com natural paternalismo por um Senhor preto, funcionário das alfandegas, naquele tempo patrão das lanchas, que se deslocavam aos navios nos dias de “S.Vapor”, e que se chamava Antonio Pitra. Foi ele que me ensinou a pilotar barcos e guiar automóveis, bem como muitas e muitas outras coisas, que sempre me serviram durante os perto de 40 anos que vivi em África.

Quando em 1991 voltei a Luanda, o Pitra convidou-me para almoçar em sua casa, no Bairro do Cruzeiro. Era uma daquelas casas grandes, com varanda colonial, que eu tinha conhecido, no tempo da colónia, como residências dos altos funcionários.

Em redor da enorme mesa estavam 7 ou 8 dos seus filhos e filhas, quase todos formados, em medicina, em direito, etc.  Ele à cabeceira e à sua frente a Dona da casa, que eu também conhecia desde garoto. Fiquei ao lado do Pitra e durante todo o almoço (muamba) ele não me largou o pulso, obrigando-me quase que a comer só com uma mão, ...e era bem visível a sua comoção enquanto conversávamos. ...Infelizmente estava com oitenta e muitos, e morreu no ano seguinte.

Se aceitamos que uma “cultura” é na verdade como que um “permis de conduire” dentro duma “comunidade”, por dela termos alcançado suficiente conhecimento, então a Cultura Crioula de Angola era o Permis que tanto servia para nos guiarmos ( Pretos, Mestiços ou Brancos ) pelos “Arruamentos de Civilização”, que para ali tinham sido transplantados , como pelas “Bárbaras Sendas do Mato”, que tanta felicidade e tão generosa liberdade transmitiam, e das quais sentimos hoje a mais dolorosa saudade.

...E essa “cultura” perdurou! E há assim que reconhecer que a enorme supremacia ( moral e intelectual ) de Angola sobre a maioria dos outros novos países africanos, provem exactamente dessa sua formação cultural Afro-Lusa, ...tão forte, ...tão intima, e tão única em todo aquele Continente.

...E eram estes “angolanos de cultura crioula”, na variedade exuberante das duas raças e suas combinações,  inesperadamente ressurgidos, de todos os lados, no momento fulcral da independência - que eu dizia ao jornalista José Ramalho terem sido os verdadeiros herdeiros dos portugueses. ...Dessa herança que se chama Angola!

...Claro que Angola Crioula é muito mais que tudo isto. ...Só tentei dar uma ideia!.

 

ANGOLA CRIOULA - III

Sabemos contudo quão difícil tem sido a consolidação desta ”civilização crioula” em Angola.

...Dificuldade que irá persistir até ao momento em que o País inteiro possa sentir que é afinal crioulo também. ...E que seja capaz de enfrentar, e vencer, as poderosas correntes internacionais que gostariam de ver instalar-se em tão rico e portentoso território outras “culturas” mais fáceis de “manipular” ...e “espoliar”!

( Também muitas vezes nos queixamos de que os crioulos não trataram com a esperada fraternidade muitos portugueses, ...”que lá podiam ter ficado”! ...Mas não nos esqueça-mos de que naquele momento não eram eles que tinham “a palavra”....E de que, de certo modo e em várias fases, também a eles Portugal abandonou. ...Não esqueçamos que muitos e muitos foram, tal como nós, obrigados a exilar-se.    ...Que outros terão sido tragicamente imolados pela tremenda confusão que se seguiu à independência...E muitos continuam ainda a sacrificar-se, todos os dias, tantas vezes até à morte, ...afinal para que Angola continue a ter essa Cultura Crioula-Portuguesa, ...que sempre sentiram ser a sua. )

Fala-se, com declarado entusiasmo, dos PALOP’s. ...E com certeza que tentar promover uma união de povos pela sua afinidade fonológica será sempre iniciativa de louvar, bem como todo o movimento que daí se gerou.    ...Mas língua, só por si, pouco significaria sem a forte envolvente, e o apoio, duma “cultura”, da qual ela seja a forma natural de expressão. ...Acabaria fatalmente degenerando numa espécie de oco brouhaha,   ...como tantas vezes acontece.

...Em Moçambique, por exemplo, também ficou a língua, mas não ficou a “cultura”. ...E isso porque na realidade nunca lá existiu aquilo a que podemos chamar uma comunidade crioula. E até que uma língua, desprovida da sua correspondente entourage cultural, está condenada a rapidamente desaparecer.

...Todos sabemos perfeitamente que aquilo que poderíamos classificar como “real e genuína cultura portuguesa”, a nossa cultura europeia, ...essa não ficou em parte nenhuma! ...Não em Macau, ...nem na Índia, ...nem no próprio Brasil ( Afinal também basicamente formado por estados crioulos, equivalentes à Luisiana ).

O que, por toda a parte, deixámos foram culturas mistas, de base portuguesa, é verdade, mas muito mais adaptadas aos diferentes cantos do Mundo por onde as soubemos espalhar, e onde, nalguns casos, irão perdurar ainda por séculos.

(...Talvez que Cabo-Verde, apesar de todas as carências, possa ser considerado, em seus aspectos social e cultural, como um perfeito exemplo do sucesso “luso-crioulo” em África )

...Penso que, tanto como a Lingua, é essa Cultura que sempre ligará Angola a Portugal.

Não estou à altura de aqui referir aspectos artisticos ( Pintura, escultura, música, etc.) ou literarios, por exemplo, em que sabemos ser a cultura angolana original, exótica e profusa.

...A abordagem de componentes religiosas desta cultura, que se coloca para alem das minhas capacidades, essa deixo-a para quem quiser prosseguir com tão aliciante proposta.

...Resta-me agora tomar a liberdade de lançar, daqui, das colunas desta Revista, o meu repto e convite àqueles que sabem e podem explicar esta “Angola Crioula” muito melhor do que eu, para que o façam! ...Porque me parece extremamente importante fazê-lo! Creio que, de certo modo, isso viria ajudar um pouco a corrigir certos conceitos e a reequacionar determinados problemas, ...sempre com vista ao difícil objectivo de aclarar no possível as desastrosas dúvidas em que aquele sacrificado País continua a debater-se.

E esse vosso contributo, que visaria, como primeira etapa, reconhecer e definir uma “Cultura Angolana”, poderia afinal vir a ter relevante importância para o futuro de Angola e o reforço dos seus laços com Portugal, e para o arranque definitivo dum verdadeiro Projecto Conjunto, que só poderia trazer vantagens e felicidade aos nossos dois Países.

José António de Sá Carneiro                          Out. 2000

terça-feira, 25 de maio de 2010

O DESEMPREGO V

ESTE “DESEMPREGO  V”,  NEM  FOI  PRECISO  ESCREVÊ-LO .   FOI-ME ENVIADO PELO MEU PRIMO J.  MANUEL  GUEDES VAZ DE ALMEIDA, ESTÁ MILAGROSAMENTE NA   SEQUÊNCIA DOS MEUS TEXTOS  ANTERIORES,   É LÚCIDO E OBJECTIVO, E  PARECE TER VINDO PARA FECHAR  O TERRIVEL  CICLO           …ATÉ  AO  PRÓXIMO  S O S, QUE NÃO SE FARÁ ESPERAR!

A VERDADE É QUE TUDO O QUE COMPRAMOS É “MADE IN CHINA”.
Eis um aviso para o futuro! Quem liga a esse aviso?
Ninguém!
Agora é só aproveitar!
E depois para os nossos filhos?

COMO FICARÁ A CHINA DO FUTURO?

-Que me perdoe o jornalista e meu colega de Marketing, Luciano Pires, estar a trancrevê-lo, mas este Blog < waterproof pilot. blogspot.com >   é praticamente secreto, e não irei prejudicá-lo.   De resto este seu texto é-me indispensável!

LUCIANO PIRES
Luciano Pires é director de marketing da DANA e profissional de comunicação.


Alguns conhecidos voltaram da China impressionados.
Um determinado produto que o Brasil fabrica em um milhão de unidades,
uma só fábrica chinesa produz quarenta milhões.
A qualidade já é equivalente. E a velocidade de reacção é impressionante.
Os chineses colocam qualquer produto no mercado em questão de semanas.
Com preços que são uma fracção dos praticados aqui.
Uma das fábricas está de mudança para o interior, pois os salários da região onde está instalada estão altos demais: 100 dólares/mês.
 
Um operário brasileiro equivalente ganha 300 dólares no mínimo que acrescidos
de impostos e benefícios representam quase 600 dólares.

Quando comparados com os 100 dólares dos chineses, que recebem praticamente
zero benefícios estamos perante uma escravatura amarela e alimentando-a.
Horas extraordinárias? Na China? Esqueça!!!
O pessoal por lá é tão agradecido por ter um emprego que trabalha horas extras sabendo que nada vai receber por isso.


Essa é a grande armadilha chinesa.
 
Não se trata de uma estratégia comercial, mas sim de uma estratégia de poder.

Os chineses estão tirando proveito da atitude dos marqueteiros ocidentais, que preferem terceirizar a produção, ficando apenas com o que ela "agrega de valor": A MARCA.
Dificilmente você adquire nas grandes redes comerciais dos EUA um produto "Made in USA".


É tudo "Made in China", com rótulo americano.

As Empresas ganham rios de dinheiro comprando dos chineses por….centavos….e vendendo por centenas de dólares.

Apenas lhes interessa o lucro imediato e a qualquer preço.

Mesmo ao custo do fechamento das suas fábricas. É o que se chama de "estratégia preçonhenta".
Enquanto os ocidentais terceirizam as táticas e ganham no curto prazo,                             a China assimila essas táticas para dominar no longo prazo.



Enquanto as grandes potências mercadológicas que ficam com as marcas, com os designes,os chineses estão ficando com a produção, assistindo e contribuindo para o desmantelamento dos já poucos parques industriais ocidentais.


Em breve, por exemplo, já não haverá mais fábricas de tênis ou de calçado pelo mundo ocidental.
Só as haverá na China.
 
Então, num futuro próximo veremos os produtos chineses aumentando os seus preços,  produzindo um "choque da manufatura",como aconteceu com o choque petrolífero  nos anos setenta.                                      
Então já será tarde de mais.
E o mundo perceberá que reerguer as suas fábricas terá um custo proibitivo
e irá render-se.

Perceberá que alimentou um enorme dragão e que dele ficou refém.

Dragão que aumentará ainda mais os preços, já que será ele quem ditará as
novas leis de mercado pois quem manda é ele.
É ele e apenas ele quem possui as fábricas, inventários e empregos.

É ele quem vai regular os mercados e não os "preçonhentos".

Iremos, nós e os nossos filhos, assistir a uma inversão das regras do jogo,
que terão impacto de uma bomba atômica... chinesa.


Nessa altura é que o mundo ocidental irá acordar mas já será tarde.


Nesse dia, os executivos "preçonhentos" olharão tristemente para os esqueletos
das suas antigas fábricas, para os técnicos aposentados jogando bocha na esquina, 
para as sucatas dos seus parques fabris desmontados, etc.
 
E então lembrarão, com muitas saudades, o tempo em que ganharam dinheiro
comprando baratinho dos "escravos" chineses, vendendo caro aos seus conterrâneos.
E então, entristecidos, abrirão suas "marmitas" e almoçarão as suas marcas que já deixaram de ser moda e, por isso, poderosas.

PEDE-SE A TODOS QUE REFLITAM E COMEÇEM A COMPRAR JÁ PRODUTOS DE FABRICO
DOS VOSSOS PAÍSES.

…MADE IN CHINA   -   QUE  FUTURO ?

sábado, 17 de abril de 2010

OS ANOS LOUCOS DE LUANDA - II

“OS  DRAGÕES”                                            ( CONTINUAÇÃO )       

…E a Coluna estacou para uma rápida reunião:  Comandantes, sargentos e cabos, cinco ou seis condutores civis.   …E,  logo em seguida, e da forma mais abrupta, o comandante desata aos berros,   manda  pôr  toda  a gente,  camionistas incluídos,  em respeitoso sentido, ao longo da berma da picada, e começa a  pregar-lhes uma das mais furiosas  descomposturas  que  eu  até  ali tinha ouvido.   ( Claro que nunca  percebi  porquê).                   Ao mesmo tempo,  e a passos largos,  ia percorrendo a fileira, duma ponta até à outra, sempre zurzindo a poeira do chão, a chicotadas do cavalo marinho, de que nunca se separava.

A seguir subiu para o Unimog e,  também em rigoroso sentido,  berrou  a  pergunta:    “Quem é o alferes mais charmoso do Exército Português ?                              E os os soldados responderam em coro:      “É o  menino  João Moreira”.                                                                         E eu, que tinha ficado sentado no banco do Unimog, devia  com certeza estar a olhar para tudo aquilo, com o ar mais  espantado do mundo.                                                          Por fim gritou a ordem:   “Siga a coluna !”

Meia hora depois, num lugar a que chamavam a Baixa da Bananeira, estávamos todos enterrados.                             …E, logo a seguir, a noite caiu.

Ainda houve uma ou duas tentativas de rebocar camions com os Unimogs, mas era preciso abrir passagens ao lado da picada, e a noite estava breu.       Assim resolveram deixar para de manhã.

Foram estabelecidos postos de sentinela,  em  três  ou quatro pontos, …mas eu, que estava a dormir dentro dum camion,  acordei a meio da noite e fui, por curiosidade, dar uma volta ao acampamento:                                               Não havia vivalma acordada!                                                 E como,  durante toda a noite,  nada de nada aconteceu, veio reforçar-se a minha convicção de que,  na verdade,  a guerra de Angola já tinha acabado.                                       …Ou, pelo menos, que alguém a tinha mandado “parar”.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

OS ANOS LOUCOS DE LUANDA II

OS  DRAGÕES

J. Sá-Carneiro                                                   Cascais, 19. 03. 2009

                                                                                          (Memória)

Desta vez é só para contar como fui parar ao Zala, “incorporado”  na escolta  militar,   mensalmente  prestada pelos Dragões,  às colunas de abastecimento à  Belavista e a  S.ta Eulália.

A Belavista era o maior aquartelamento do Norte, que servia as províncias do Uige e do Zaire (Congo Português) junto à fronteira da República do Zaire (Antigo Congo Belga).  S.ta Eulália era a Base Aérea do Norte de Angola.   O Zala era um posto de combate, no meio do mato, “terra de ninguém”, pois que, servindo de escala,  normalmente era abandonado após a passagem da coluna, e assim ficava até à próxima.

...Mas francamente não sei muito bem por onde começar.    …Vamos a ver:

Quando tinha que despachar aviões,  em geral charters da África do Sul,  na alfândega do Aeroporto, tarde da noite, ou às vezes já de madrugada, era sempre eu próprio que me encarregava desse serviço, nunca o entregando aos ajudantes.  E naturalmente que haveria nisso uma certa intenção,   ...mas sem pecado de maior. Até confesso:   É que então acontecia que, antes ou depois do avião, eu acabava, quase que fatalmente, por dar um salto aos cabarés,  quanto mais não fosse  para espreitar as “novidades”.       E foi isso mesmo que aconteceu naquela noite.

Mas antes de entrar em pormenores dêem-me só uns minutos para tentar explicar o que eram os Dragões de Angola. (Tropa de cavalaria, motorizada:  Uma companhia no Sul, e um esquadrão em Luanda): Quando estoirou o terrorismo, em Fevereiro de 1961, com o ataque à ‘brigada móvel´da estrada de Catéte  e, um mês depois, a mortandade no norte de Angola de mais de 2.000 europeus e 5 ou 6.000 africanos, que ficaram ao seu lado, os Dragões constituíam praticamente a única unidade militar europeia que existia na Capital ...e eram só 85, ...incluindo o seu comandante, o capitão de cavalaria José Maria Mendonça Júnior.       O resto da unidade era formado por cerca de 200 africanos, que o capitão Mendonça sempre teimou em não levar a combate.  Conheci (E ainda conheço) muito bem o Zé Maria e, numa outra ocasião, se ele concordar, tentarei contar algumas das suas histórias.       Conheci também, com certa aproximação, alguns seus dragões, dentro os quais ainda destaco o Jean-Jean Penaguião.                     …Mas eram todos bons. ...E foram eles que, na verdade, nos salvaram, pois durante uns bons três meses não chegou qualquer socorro a Luanda, com excepção duma companhia de páraquedistas, que logo foi expedida para o mato.

Mais militares europeus: Cerca de três dúzias de policias, que ao todo dispunham de 12 pistolas, estando uma delas definitivamente encravada, e que eram rendidas, quando rendidos eram os guardas de giro. Dez ou doze para toda a cidade. Podia-se ainda contar uma vintena de guarda-fiscais, também mais ou menos armados, de Parabelum’s da 1ª Guerra os do porto de mar, e de duas FBP´s de 9mm, os do aeroporto.

Luanda teria naquele tempo cerca de 50.000 europeus. Mas armas só de caça, e poucas. E os Muceques, com perto de um milhão de africanos, ferviam ali à nossa volta.

...Outra vez na História, arremedando o Churchil, nunca tanto se deveu a tão poucos.

Mas o relato que agora vos transmito diz respeito a factos ocorridos meia dúzia de anos mais tarde e o Capitão Mendonça já nem sequer estava em Angola, pois penso que teria sido promovido e transferido para Timor, como ajudante do Governador Geral.

Também não me recordo de quem era o comandante dos Dragões naquela altura.

Porém voltando aos cabarés;   ...Figuras crónicas da noite:   O Salvador, despachante-oficial meu colega, o Sousa Batoteiro, com os dedos carregados de aneis, o Gentil do dente de oiro, ...esses nunca falhavam. ...Mas também o Cristiano Lane e o Luiz Gama, o Teófilo Esquível e o Tito Larcher, enquanto lá estiveram ...e uns tantos outros.

...E depois havia os oficiais e sargentos milicianos, “da guerra”. Isto passa-se em 1967 ou 68. E eu, como saia bastante à noite, conhecia-os a todos.

A guerra durou 14 anos, e foram muitas as incorporações, algumas de Angola, mas a maioria metropolitanas, claro, de generosos rapazes que, sempre cheios de entusiasmo e alegria, se sacrificaram, muitos deles até à morte, para defender uma terra, que na verdade nos sustentava a todos, ...lá e cá, ...e que depois “os outros” deitaram fóra.

( Não estou a falar da independência.   ...A independência tinha que ser!    Estou a falar do abandono,   ...que evidentemente não tinha que ser.    Nem podia ser!   …E que foi! …Por engano …e total inépcia.      …Para não se dizer pior!)

Luanda daquele tempo era a cidade africana com mais vida nocturna, a sul do Equador. Havia uma profusão de boites e bares por todo o lado.   E não faltavam cabarés.   Quando entrei no “Embaixador”  dei logo de caras com o João Moreira, alferes dragão, de Moçamedes, e o Nuno Alegre “Rato”, miliciano da Metrópole, do Porto. Chamaram-me para a mesa deles, apresentaram  as  pequenas,  e  foi assim que começou.

A noite foi igual às outras:  Copos, saúdes, graças   ...alegria.           …O espectáculo até nem era mau.    … Havia um número com uma baiana engraçadíssima, ...e gordíssima, intima de todos nós, e depois o maitre anunciava “Senhoras e Senhores agora apresentam-se as irmãs “Sisters”, da África do Sul”. ...E depois dançava-se, ...e depois mais copos ...e fichas.

Quando saimos de lá, às quatro da manhã, é que eles me disseram que:   “Agora vamos a casa fardarmo-nos num instante, para nos juntarmos à coluna para o Zala, que sai às cinco horas”.   Duas Panhards e quatro Unimogs dos Dragões iam escoltar cinquenta camions civis.  Era o abastecimento, quinzenal, do Zala e da Bela Vista, cuja escolta daquela vez cabia aos Dragões.                            Comandava a coluna o “Rato”,  e a escolta o João Moreira.             Há muito tempo que eu ouvia falar do Zala, onde as colunas eram sempre atacadas, ou pelo menos flageladas, e estava com imensa e mórbida vontade de ir lá espreitar,  mas ao mesmo tempo fazia-me um certo arrepio.   ...Por outro lado estava triste e sozinho em Luanda.     A Ingrid tinha-se zangado comigo e ido para casa da Mãe, em Lisboa.   E a ir ao Zala era com aqueles.     …Por isso perguntei:  Posso ir com vocês?”       -        “Só se arranjares uma farda.    ... E por amor de Deus não morras, senão estamos feitos”.

O meu primo Zé Manel (o Guedes Vaz), tambem alferes miliciano, estava destacado no Saurimo, e tinha deixado lá em casa uma muda de camuflado. Era grande demais para mim, pois que ele tem um metro e noventa, mas de mangas arregaçadas, até nem me ficava mal. Armas não me faltavam, pois tinha as da fazenda. (Felizmente nunca tive que usar nenhuma). Escolhi uma pistola FN, de 9 mm, com carregador para 12 ou 14 cartuchos, que me estava cedida pelos Voluntários (OPVDCA),   ...e ainda cheguei à coluna antes deles. Os soldados ficaram a olhar para mim com um ar muito admirado, mas eles chegaram logo a seguir e fizeram a apresentação ...como “correspondente de guerra”.     Houve um toque de clarim (intempestivo àquela hora, ali em plena cidade) e a coluna arrancou. Eu, que tinha subido para um Unimog, deitei-me no chão, ao comprido, pois não havia lugar no banco, o que até me convinha porque estava a morrer de sono.    Mas como os Unimogs não tinham taipais, para que os soldados saltassem depressa para combate, se pegasse a dormir acabaria por rebolar para a estrada. Porém os Dragões resolveram logo o problema.   O banco era corrido e os homens iam sentados dos dois lados, costas com costas.   Assim deitei-me debaixo do banco, por trás das pernas dos soldados, e já não havia o risco de rolar para fóra.   Devo ter adormecido imediatamente.

Fui acordado pelas tremendas sacudidelas do Unimog. Tinhamos deixado o asfalto e já singravamos em plena picada. Abri um olho,   ...estava o dia também a espreitar   ...e só via botas.

Quando consegui acordar por completo, e focar a realidade que me cercava, acho que apanhei o maior dos sustos. E até talvez tenha pensado que tinha sido raptado por terroristas. ...É que a única farda à vista, em toda a extensão da coluna ...era a minha. Todo o resto era um carnaval:   Tangas e calções de banho. Boinas, bonéts  e barretes de toda a espécie, turbantes   ...e até penas na cabeça.    O comandante da escolta envergava uma elegante jaleca, creio que de bombazine preta. Para completar, uma boina de veludo, com pon-pon, roubada a uma amiga nossa. O “Rato” estava fora de vista e já não me lembro como estava embrulhado. Na Panhard da frente, sentado na torreta do canhão, que era anti-carro e ali só servia para assustar, ia o vigia-corneteiro.  E cada vez que se ouviam detonações, e ele apontava para as colinas, o João Moreira, sentado ao meu lado no Unimog, berrava-lhe: “Toca a toiros, ...Toca a toiros!” ...E o clarim vibrava.

De inicio tudo aquilo me pareceu completa palhaçada. ...Mas mais tarde vim a perceber o seu estranho efeito psicológico: Do nosso lado, mantinha o moral ao alto e até mesmo a alegria. Do lado do inimigo, parece que o deixava completamente “baralhado”,  e o resultado é que nunca a escolta dos Dragões teve baixas, e foram muito raros quaisquer ferimentos. ...Enquanto que sempre que a escolta era feita por unidades expedicionárias,   da Metrópole, havia feridos e, não poucas as vezes, baixas mortais. ...Além de enorme desperdício de munições.   O facto dos Dragões serem tropa angolana, embora só um único fosse de raça negra, por acaso um dos alferes, talvez também ajudasse ao seu sucesso.      Os condutores eram continentais, transmontanos.    …Mais tarde conheci-lhes o mérito.

A dada altura começamos a ouvir rajadas de pistola-metralhadora, mas longe. Ninguém ligou nenhuma, e a coluna prosseguiu.           O tempo começou a escurecer à nossa frente,  e pouco depois estava a chover. …E assim se foi passando o dia todo. Mais tiro, menos tiro, e cada vez mais chuva.   Por volta das cinco da tarde    já os tiros se ouviam muito próximos, e as detonações eram mais fortes, já de espingardas. O mato, que chegava até à berma da picada, era tão fechado que nada se via através dele. Também se ouviam vozes, já muito próximas. A coluna seguia a paço de tartaruga, com os carros a enterrarem-se na lama.

…E foi então que o comandante da escolta deu voz  de paragem.

                                                                                                    (CONTINUA)

OS ANOS

terça-feira, 30 de março de 2010

A DIFICIL OPÇÃO (Ensaio)

 

V. R.                                                                  Memória  -   Março  2006

                                                        -  I  -

Estávamos nos fins do Século XIV e, extinta a nossa primeira Dinastia, começava a esboçar-se uma nova era, a qual teria forçosamente que ser diferente de tudo o até então experimentado.

Os ultimos moiros já tinham sido, desde há muito, varridos das Praias Algarvias, e as Fronteiras norte e leste estavam quase definitivamente demarcadas. ...O Território era todo nosso!

O Futuro parecia sorrir ao pequeno Portugal, ainda jovem de pouco mais de 200 anos.

Mas, de modo inesperado e algo dramático, ...começa a constatar-se que esse Território, tão sofrido e almejado, não era afinal suficiente para sustentar o escasso milhão de Portugueses que eramos naqueles tempos. ...Para os Moiros tinha chegado! ...Mas os Moiros não eram muitos, ...e capazes de fazer agricultura até no próprio deserto. ...Porém para nós, com fraco saber agrícola e pobre apetrechamento, não chegava com certeza.

Terras na verdade férteis, só os vales do Mondego e do Tejo, e as planuras de estuário do mesmo Tejo e do Sado. Mas essas eram as justamente necessárias para o Trigo, para o Pão de Cada Dia. ...Outras culturas? ...Já os Vinhedos,  ...os tinha mandado o nosso avisado rei D.Dinis para as encostas do rio Douro, originando uma empresa, épica e sacrificada, que sabemos agora só ser comparável aos arrozais em desníveis da China e  Japão.

...Gado, ...só miúdo. ...Para o grosso os pastos eram fracos, face às chuvas quase sempre irregulares. ...Pescas? Tinham pouca expressão naquela época. ...Como agora, por outros motivos, nos torna a acontecer. ...Riqueza Mineira? ...Os romanos, 1.500 anos atrás, haviam-na praticamente levado ao esgotamento.

...E, face a essas razões, deparámos-nos, pela primeira vez, com o crónico Dilema Nacional:

...Por mais voltas que se dessem, só dois caminhos se ofereciam. ...Duas restrictas Opções:

A)  -   Contemporizar com Castela, aceitando a tendência, que começava a desenhar-se, para um movimento unionista que, um século depois, sob os Reis Católicos, iria culminar na coligação de quase toda a Península ao redor dessa mesma Castela. ...E a que, perdido aquele momento de opção, teriamos fatalmente que aderir, ...até face à séria Teoria, já nesse tempo sentida, de que, geográfica, demográfica e economicamente, eramos nós parte integrante da Espanha ( Ou seja da Hispânia, ...ou Ibéria, ...ou como se queira dizer).

B)  -   Tomar os Rumos dos Mares, ...na procura das Terras do “outro lado”.

E a escolha fez-se ! ...E foi, como é sabido, ...a da Revolução de 1383 e,  dois  anos  depois,   ainda  muito  mais  grave  e decisiva,       ...a  da  BATALHA  DE  ALJUBARROTA.

...A DIFICIL OPÇÃO tinha sido tomada!

Trinta anos decorridos estávamos em Ceuta, em demanda do Trigo do Reino de Fez, que sabíamos abastecer a ainda moira Andaluzia, já quase toda cercada pelos reinos cristãos. ...Porém o trigo tomou outros caminhos, e assim Ceuta se transformou num fiasco, bem como todas as Praças, depois conquistadas, na Costa do Marrocos. ...Mas que seja permitida uma correcção: É que na verdade …nem tudo foi fiasco. Há com certeza que excluir os instrumentos náuticos, árabes e moiros; astrolábios, agulhas de marear, tábuas e al-manaques, aos quais tivemos acesso nas embarcações nesses portos apresadas, e que nos permitiram a navegação ciêntifica do Atlântico, tal como os árabes, dois séculos atrás, tinham tido as suas epopeias do Indico e do Pacifico.

...Mas íamos sempre navegando para sul, e acabámos por chegar à Costa da Mina (Hoje mais ou menos a Nigéria) ...E aí sim! ...Tinhamos chegado às riquezas! ...E de lá começamos a trazer o oiro e o marfim.

...Mas tambem a colaborar, com europeus e africanos, num outro "comércio", corrente e natural naquela altura, ... porém hoje “de muito triste memória”...

...E depois foi a Guiné, ...e Angola! ...Mas, à época, pouco valor se dava a essas terras. Não estávamos propriamente à procura de plagas quase virgens, mas sim de Paises mais ricos e desenvolvidos do que o nosso, capazes de nos fornecer tudo aquilo que não tinhamos.

...Dobrado o Cabo, chegámos às Indias! E então, nesse 2º século de Expansão Ultramarina, ...das Indias fomos vivendo! (...Extrema riqueza para alguns! ...E muita amargura para outros.) ..Até aos dias em que holandeses, e depois ingleses (nossos aliados) nos escorraçaram das melhores posições.

Mas, impedidas as Indias, ...saltámos para o Brasil, ...até aí quase esquecido, ...e nesse Terceiro Século Ultramarino foi, como se sabe, do Brasil que nos valemos.

...Todavia, com a independência brasileira, surge a ameaça de também essa fonte vir a acabar, fatalmente ressequida. ...Entretanto ...e surpreendentemente, mediante certos arranjos de tenças e pensões de familia e um comércio de preferências tradicionais, foi ainda o Brasil capaz de nos ir amparando, por mais uns tempos, até à proclamação da sua República...

...Quando finalmente tudo se acabou, olhámos em roda. ...E o que restava? ...A África!

...Sobretudo de Angola e de Moçambique poderiamos fazer outros Brasis!

...E foi o que se tentou:

...Mas Moçambique revelou-se afinal mais pobre do que pensávamos. Só, muito depois, as chamadas “companhias magestáticas”, normalmente “concedidas” a ingleses, com a sua agricultura extensiva, do chá ou do algodão, para a qual nós portugueses não estávamos de todo vocacionados, se provou virem a ser realmente produtivas.

A maior distância à Metrópole também não ajudava. ...Até aos ultimos tempos da nossa colonização, a principal exportação de Moçambique era a da castanha de cajú, espontânea, apanhada no solo pelos garotos das sanzalas e vendida a baixo preço aos comerciantes indianos, que a expediam para o estrangeiro.

...Mas e Angola? ...Essa comprovou-se ser fabulosamente rica! Angola!

...E foi este, quer se goste ou não da ideia, o nosso verdadeiro percurso económico.

O Milagre Português, além da expansão religiosa e civilizacional, que nunca nos poderá ser negada, foi sobretudo o de sempre ter conseguido amparar a sua economia nos sucessivos Ultramares descortinados!

...Mesmo a passagem pelos 60 anos dos Filipes (Em que Portugal nunca perdeu oficialmente a sua independência, pois que o II de Espanha se chamou I entre nós. ...E assim até ao fim da dinastia), não havia chegado a interromper a mecânica deste processo.

...Sem as colónias teria sido altamente improvável, senão por completo utópica, a perduração, por tantos séculos, de um Portugal independente.

...Mas a partir da segunda Grande Guerra (Sobretudo desde 1942) foi quase exclusivamente Angola que sustentou a nossa economia: Começámos pelo Sisal, vendido aos USA para a rama-explosiva dos canhões navais, depois o Café, com seu tremendo desenvolvimento, a seguir as Madeiras, a farinha de Peixe, o Algodão, o Ferro para o Japão, os Mármores para Itália, ...uma diversidade de Minérios ...para toda a parte. ...etc., etc. ...E ainda o Ouro págo pela África do Sul à Diamang.

...Porém foram sobretudo o Petróleo e os Diamantes que pagaram as 3 Guerras Coloniais, além da “expressiva remessa de Moeda Forte” que, enviada para Portugal até 1975, parece ainda ter durado pelos anos 80, ...já com as colónias desde há muito independentes.

A “Receita em Divisas” de Angola, nos anos 70, terá tavez sido décupla da que a Metrópole conseguia por si própria, mesmo incluindo os vinhos, em barril e tanque, e os tecidos de algodão, que afinal tambem para Angola, e para as outras colónias, eram exportados.

“Divisas” essas imediatamente expedidas para Lisboa, ...enquanto se pagava aos locais ( europeus ou africanos ) em “angolares”, ...e mais tarde em “escudos-angolanos”, ambos inconvertíveis.

...E assim ...foi Portugal considerado o Milagre Económico Europeu de 1973!

 

                                       A DIFICIL OPÇÃO

                                                     -  I I -

Estamos em Março de 2006 e acabámos de eleger um novo Presidente da República.

Há um ano atrás tinhamos feito a escolha de um Governo Socialista, que até agora tem desempenhado com razoável eficácia o seu “possivel” exercício.

Assim do ponto de vista propriamente “Politico”, Presidente e Primeiro Ministro, ambos são “democratas”.

Quanto à sua feição “Politico-Económica”, teremos que o Presidente será “Liberal”, enquanto que o 1º Ministro é “Socialista”. ...Perdoe-se-me se estou enganado!

Poderemos ter assim chegado a uma “fórmula de óptimo equilíbrio”. ...E é no “superior entendimento” entre os dois, que depositamos toda a nossa “esperança”, pois que a crise, em que acabámos por cair no inicio do milénio, apesar da imensa ajuda da U.E., parece ter atingido agora profundidades abissais e, na perspectiva de abrandamento do feed-back europeu, só com muito esforço e imaginação conseguiremos alguma vez sair do fundo do poço.

Perdemos as ultimas Posições Ultramarinas há 30 anos, e só agora se começa a compreender que Portugal não era “viável” sem elas!                                                                                                                   Sabemos que foi “o Mundo” que nos obrigou a  abandoná-las.     ...Mas poderiamos de lá ter saido de melhor maneira!

...Ou até mesmo lá ter, em grande parte, permanecido. O mal não foram as Independências, ( ...Que teriam que acontecer.) ...O mal foi o abandono! (…Que não podia ter acontecido!)

...E todo o Angolano esclarecido nos acusa agora exactamente disso. ...De qualquer modo também sabemos que, na época presente, era impossivel continuar, ao nosso antigo “jeito”, ...pois que só as super-potências podem ter, ou fazer, colónias, e isso em moldes completamente diferentes.

...Mas então há que procurar outras soluções, ...pois parece que a União Europeia, indispensável para salvaguarda da Europa, e até para que os europeus voltem a ter as suas tradicionais força e dignidade, não será afinal “panaceia para todos os males”. Parece-nos por isso que não irá resolver, em especificidade e pormenor, os problemas íntimos e as carências endógenas de países  pobres e pequenos como Portugal.

Assim, perante o dramático panorama, de desemprego, pobreza, inflação e até (Talvez e paradoxalmente) deflação, com que presentemente nos debatemos, sabendo que será extremamente difícil instalar novas Industrias, com técnicas penosas de aprender, ou uma nova Agricultura, moderna e sofisticada, ...financeiramente incomportável, ...ou ainda Serviços de Luxo ( Turísticos, de Saúde, ou outros ), que poderão ajudar, mas que não resolverão o nosso “Mal”, ...quase começamos a sentir-mo-nos outra vez perante A DIFICIL OPÇÃO de seis séculos atrás: ...ESPANHA ? ...OU ÁFRICA ?...

...Contudo, de Espanha, embora não viéssemos a sofrer qualquer perda de nacionalismo ou patriotismo com uma “Confederação”,

...continuamos a dizer ...“que nem Bom Vento”…

Não sabemos se há lógica nisso. ...Afinal praticamente todos os Estados Europeus são Uniões de pequenas (e até geralmente menos pobres) Nações como a nossa: O Reino Unido, a Itália, a Alemanha, a Holanda, a Bélgica, a própria Espanha, ...todos são “Uniões.” ...E até na América, ...o Brasil é uma Federação, ...e os Estados Unidos ...são “Unidos”.

...Mas NÓS não queremos! ...Talvez em parte, e de há longa data, por uma certa influência estrangeira, “nós”, que até possivelmente conseguiríamos resolver os nossos problemas com uma Solução Confederada, ...“Nós”, nem pensar! Preferimos o Orgulhoso Sacrificio do SÓS.

...E Assim Seja!

...Mas então resta a outra Alternativa: Outra vez o ULTRA-MAR, ...outra vez a ÁFRICA!

...E, na melhor das hipóteses, outra vez ANGOLA!.

...Claro que não pensamos em colonizar Angola, ...agora um Estado de Direito ...e muito maior e mais rico que o nosso. No que pensamos é numa Cooperação Ampliada, Cultural e Económica, que, se feita nos moldes convenientes, os Angolanos aceitarão e que seria, para todos, da maior conveniência.

Como o desenvolvimento cultural e até industrial e agricola de Angola ainda será, por muitos anos, processado em lingua portuguesa, é evidente que haverá sempre a maior necessidade de professores, engenheiros e outros técnicos; ...Médicos, ...veterinários, ...agrónomos, ...etc., ...etc.

...Serão precisos também manuais didácticos em português, literatura cultural e ligeira, ...toda uma diversidade de material tipográfico, ...e até cartográfico

...E muito, muito mais!...

...Em contrapartida poderiamos nós tomar posições preferenciais relativas a muitas das produções de Angola, que colocariamos por toda a União Europeia, ou poderiamos reexportar, em muitos casos com “draubaque”, para quaisquer outros mercados.

...Porque não voltar a desenvolver a nossa Medicina Tropical, que chegou a ter vulto de relevo internacional nos anos 50 e 60? ...Porquê não construir um Hospital Universitário Português em Luanda ? ...E um Instituto Superior de Agricultura Tropical? Para Angolanos e Portugueses, claro.

...Isso sim, seria real e genuina Cooperação.

Porque não propor a Angola um “Regime de Concessões Agricolas” ( De 30 ou 40 anos, por exemplo), que empregariam milhares de Angolanos, e que findos esses anos, lhes seriam entregues em definitivo.

A 120 Kms de Luanda, a partir do Úcua, começa uma região de floresta e café, a das antigas plantações dos Dembos, com cerca de 2.500 Kms 2, que constituem um “mundo maravilhoso”, ...praticamente abandonado! ...Lá trabalhámos por mais de 20 anos, até 1975.

Em Julho e Agosto do ano passado percorremos grande parte da área, e verificámos que, das 40 a 50 fazendas que ali laboraram, pelo menos metade ainda está perfeitamente recuperável.

Para se começar, julgamos este um estupendo projecto para os nossos estudantes de agricultura e silvicultura! ( ...E até talvez as Organizações Internacionais nos ajudassem.)

Simplesmente tudo isto teria que ser negociado com um máximo de inteligência, honestidade e respeito, de parte a parte.

...E o Processo levado ao ponto de Grandes Empresas Nacionais dos dois Paises.

...Há concerteza um “aspecto” de que podemos estar completamente seguros:

Os Angolanos gostam de Nós, ...preferem-nos a Nós. ….E Nós continuamos a gostar ( E a compreendê-los como mais ninguém ) …dos Angolanos.

...Mas tal “aspecto” tem que passar do “abstracto”, ...tem que ser “concretizado”!

...E para terminar, tudo o que espero é que este apontamento chame a atenção de alguém com mais capacidade, menos idade, e em melhor posição do que eu, para estudar e, se lhe encontrar algum mérito, desenvolver e activar um tal Projecto.

Março de 2006 J. Sá-Carneiro ( * )

( * ) José Antonio de Sá Carneiro

Natural de Lisboa – 1927 ( Nacionalidades Portuguesa e Angolana )

Despachante-oficial da Alfândega de Luanda de 1952 a 1975

E das Alfândegas Portuguesas desde 1980

Diplomado em Services Marketing Management pelo SAMA de JHB

Licenciado em História pela Universidade Aberta de Lisboa

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

ANGOLA E OS PORTUGUESES - I -

“COLONIALISMO” ?  OU  “COLONIZAÇÃO” ?

                                                                                           ( MEMÓRIA 1989 )

É costume dizer-se que os portugueses estiveram em África  5 séculos. ...É verdade, mas durante 4 desses séculos só estiveram nas costas de África. ...De inicio tudo o que lá tínhamos eram pequenas feitorias, que apoiavam caravelas e naus em demanda das Indias. A riqueza, em potencial, de Angola não nos interessava:  ...Ao tempo não se falava em petróleo! ...E muito menos em urânio. ...E já em pleno século XIX construíamos casas na baixa de Luanda, ou em Benguela, empregando madeira ... levada do Brasil.   ...Para além de Massangano, conheciamos tão pouco o interior, que nem a madeira aproveitávamos.

...A verdadeira colonização de Angola só começou depois da Conferência de Berlin (1885). ...Podemos portanto dizer que Angola só foi colonizada pelos portugueses durante 90 anos, até à sua independência em 1975. É facto que ao tempo das feitorias já se fazia um pequeno comercio, de permuta, com os nativos: Um pouco de ouro e algum marfim, contra missangas, facas de aço e tecidos, tudo em muito reduzida escala. ...Fazia-se entretanto um outro comércio, esse de infeliz memória, mas que era uma prática natural e costumeira daquelas épocas: a “escravatura”. ...E está agora em grande moda vilipendiar a expansão europeia pelas Áfricas, com ataques perversamente dirigidos ao“colonialismo” e à “escravatura”. Claro que esses são aspectos que nunca poderemos tentar embelezar. ...Mas podemos é passar a olhá-los com uma atitude diferente, ...sem vergonha, nem remorso.            A escravatura era, desde os tempos mais remotos, uma prática instituída entre todos os povos  africanos.                                            

As tribos maiores e mais poderosas apressavam e escravizavam as outras ( Quando ás vezes não acontecia pior ).  No comércio esclavagista para “fóra”, para as Américas, era sempre um negreiro africano que fazia a venda a um europeu.  …E podemos dizer que tiveram muita sorte os escravos que atravessavam o Atlântico porque, passado o martírio da viagem, tudo nas Américas era incontestávelmente melhor do que o destino que lhes estava reservado em África.        …Para eles, e sobretudo para as gerações deles descendentes.       A maioria das pessoas não tem a menor noção do que era a vida em África antes da chegada dos europeus.  ( Tudo o que lá me foi possível estudar, durante quarenta anos, me leva a concluir que a vida era “um completo horror”:    O nomadismo da eterna corrida atrás da caça, porque a caça corria atrás da chuva.   …e quando não a apanhavam, as grandes fomes cíclicas que tinham que levar à antropofagia.  Eram caçadores- recolectores.  Nunca fizeram um mínimo em agricultura.  A mandioca,  o milho e a batata só para lá foram levadas, pelos portugueses, já em pleno século XVIII.  Antes disso tudo o que comiam eram algumas raízes,  e raros frutos, de que nem gostavam.   Não sabiam pescar, nem de rede, nem de anzol, e os seus arpões não tinham barbela.                            A par disso, os constantes sacrifícios humanos, de feitiçaria ou religião, muitas vezes de crianças e raparigas, eram de um horror indescritível.  Ou as execuções por supostas razões criminais.         

E ainda as terríveis “cirurgias” praticadas a quando da puberdade das raparigas, que muitas vezes as vinha a matar com infecções.

Não, não nos venham falar do Mito duma “vida cor de rosa em África” antes da chegada dos europeus.                     

                                                    ____________

“Colonialismo” seria obrigar o colonizado a trabalhar para o colonizador sem que este ultimo tivesse que o fazer. Mas isso era o que faziam alguns portugueses daqui da Metrópole, ao beneficiarem das “divisas” obtidas por Angola, sem precisarem de trabalhar em África. ...O que se fazia lá era outra coisa: Era “colonização”. Era o branco a trabalhar ao lado do africano, e em muitos casos mais 2 ou 3 horas por dia do que aquele. ...E a colonização não continha só aspectos negativos. E nem sequer era propriamente degradante ou aviltante, como agora se quer fazer crer. Os antepassados dos portugueses tambem foram colonizados. ...Seiscentos anos só pelos romanos, que até nos ensinaram a ler e a escrever, que até nos civilizaram! ...E mais tarde, uns 4 séculos pelos árabes, com quem também muito aprendemos.

...Afinal como é que toda a Europa foi civilizada? Exactamente pelos mesmos romanos, com séculos e séculos de colonização. ...E mais tarde, pelo menos os Paises do Sul, pelos muçulmanos, árabes e moiros, que lhe trouxeram o conhecimento da agricultura (P. além do trigo), da arquitectura (d’arcos e ogivas), da medicina e da farmácia, da filosofia (Pela tradução dos clássicos gregos) e até da música (Alaúde, que deu origem à guitarra).    E também da matemática, incluindo os "Al-garismos" e o conceito de “Zero”, que originou a “Álgebra”, seja a  diferenciação positiva-negativa,  expressa por algarismos  e letras.     …E por fim, o “Sistema Decimal”.

A colonização da África ( A Sul do Sahra ), essa foi feita pelos europeus, ...mas só a partir da Conferência de Berlim, que, por proposta portuguesa, teve lugar em 1885. ...Tendo portanto tido muito curta duração: Cerca de 60 anos no caso do Congo Belga, ou da Guiné Francêsa. ...85 anos em Angola, a mais longa, ...não falando da África do Sul, ...que teve uma descolonização “por dentro”, pois que a potência colonizadora era Pretória.

...E, embora de certo modo intensiva e dinâmica, foi afinal branda e benigna, e de  curtíssima duração,  se a  compararmos com os mil anos de colonização romana na Europa.

Pela colonização os europeus conseguiram, em menos de 100 anos, arrancar milhões de africanos da Idade da Pedra e guindá-    los para o Século XX. Doutro modo esses africanos teriam sido obrigados a percorrer milénios para fazer o mesmo percurso!

....Também se fala agora muito de “escravatura”. Em realidade foi muito triste a escravatura! ...Mas não teremos nós memória?  Na verdade os africanos (alguns) foram escravos dos portugueses, por cerca de 200 anos. Mas os avós dos portugueses, como todos os europeus ( Como todos os povos do mundo) foram escravos por milhares e milhares de anos. Já não nos lembramos que os nossos antepassados remaram nas galés e morreram nos circos de Roma? ...Custa a compreender porque é que nunca houve pressões sobre os árabes do norte de África, que também são estrangeiros naquelas terras, e esses sim, ainda hoje são esclavagistas, ...e foram escorraçar-nos, a nós portugueses, que tão dolorosa falta fazemos lá em baixo,...e que estávamos de tal modo interligados com os africanos que poderíamos ter passado juntos à independência, sem atrito de maior. Angola, pela sua cultura Luso-Africana,  neo-crioula,  que a tornava diferente de qualquer outro país do Continente Negro,  parecia pouco vulnerável aos ataques das grandes potências. ...Afinal as super-potências conseguiram subverter Angola ...E nós fugimos de lá, deixando-a com 4 facções em guerra, e os angolanos em grave risco dum regresso à sua desgraça milenar:   Doença do Sono, Paludismo, Cólera, Lutas Tribais.    ...E por fim ao Retorno da            Escravatura”, pois que, antes da chegada dos europeus à África,  os povos  negros eram todos escravos uns dos outros.                      E  agora bem pior, porque eles já não sabem sobreviver na selva, como “quando corriam atrás da caça, quando a caça corria atrás da chuva”,   mas também ainda não tinham aprendido a viver nesta nossa perigosa e traiçoeira  “civilização”.                                     O outro risco é cairem em poder de uma das tais super-potências, a quem só interessa o petróleo e determinados  minérios, sem perderem um minuto com a promoção da agricultura e, de um modo geral, sem o menor interesse pela promoção civilizacional dos angolanos.

                                                                                                               

ANGOLA E OS PORTUGUESES - II

Portugal sempre viveu dos seus sucessivos  Ultramares.              Mal tínhamos empurrado os moiros das praias algarvias e já corríamos para Ceuta.    E depois pelas Áfricas  todas, pelas Indias, ...pelos Brasis. Parece que sempre soubemos que isto aqui não chegava para nos sustentar! ...E éramos poucos mais do que um milhão naqueles tempos. ...E assim foi a epopeia nacional! Mas depois fomos perdendo as Indias ( Seja: o seu comércio) ...os Brasis, ...e por fim só nos restavam as Áfricas. ...E das Áfricas conseguimos viver grande parte dos séculos XIX e XX.

...Mas, sobretudo a partir da ultima Guerra Mundial, foi Angola que nos manteve.

(Angola, que já nos anos 30, através do contrato entre a Diamang e a Anglo-American, tinha págo metade da escandalosa divida da 1ª República ao estrangeiro.   …A outra metade foi pága por Moçambique, pelo prémio-ouro dos mineiros,  contratados pela África do Sul).                                                                                                      

E que, sobretudo após 1942, passando a exportar, em grande escala, o sisal, para os USA, para material de guerra, e depois os diamantes, o café, as madeiras, o algodão, etc, para toda a parte, se converteu num potencial “gerador de divisas”, que foi sustentando a Metrópole, até que começou a exploração do petróleo.

...E daí para a frente a Metrópole deixou de ser sustentada,  para passar a ser enriquecida por Angola. ...É dificil compreender como neste País a maioria das pessoas não tem a minima noção de que Portugal viveu o meio século, até 1975, quase que exclusivamente à custa de Angola, ...dos angolanos... e dos portugueses que lá estavam.

(Claro que à época isso não se podia confessar, porque era... “colonialismo” !)    Poderemos mesmo afirmar que as “divisas” ( dólares, libras, marcos ...e o ouro ) obtidas por Angola ainda nos sustentaram até recebermos as primeiras “ajudas” da Comunidade Económica Europeia.

Vejamos: Em 1973 Portugal foi internacionalmente reconhecido como “O milagre Económico Europeu”.   Esta afirmação é muito fácil de confirmar nos jornais da época. Ora nesse ano a maior receita em “divisas”obtida pelo Portugal metropolitano foi a dos magros 20 milhões de contos das pensões dos emigrantes. Seguida de 10 milhões do turismo (Record). As exportações ( Vinho, cortiça, pasta de tomate, tecidos, sapatos, etc.) não chegavam a ter expressão. Ainda por cima mais de metade dessas exportações destinavam-se exactamente a Angola e às outras colónias, que eram obrigadas a comprá-las, pelo que vinha tudo a dar na mesma.

Os portugueses de raça europeia de Angola eram só 600.000 ( 50% crioulos,  50% metropolitanos ) e, mesmo com a importante colaboração dos angolanos, não conseguiam explorar mais de 10% da riqueza em potencial da colónia, dizia-se. ...Porem esses 10% da riqueza angolana seriam o décuplo de tudo aquilo que a metrópole conseguia produzir.    Difícil de confirmar. Talvez um pouco menos, ...ou até muito mais. As contas eram secretas. Só o valor do petróleo já ultrapassava em muito tudo o que cá se produzia. Mas depois era o ferro para o Japão, o ouro, o urânio, o cobre e o manganês, outros metais, e os diamantes e outras pedras. O café, o algodão, o sisal, o açúcar, a soja, o girassol, o peixe e a sua farinha, o marisco. etc, etc, etc.

...E foi com tudo isso que conseguimos ser “O Milagre Económico Europeu de 1973”

...Angola pagava as 3 guerras africanas e ainda sustentava a Metrópole!

Angola era a “Usina” que sustentava Portugal! Era a portentosa e frutuosa “Usina” que mandava para cá os dollares, os marcos e as libras de que os portugueses viviam, ...sem saber!

...Mas quem fazia funcionar uma tal “Usina”? ...Eram os portugueses que lá estavam, evidentemente! ...E seus colaboradores angolanos. ...Que, trabalhando em climas doentios com temperaturas de 40 graus, muitas vezes em regiões infestadas pela mosca do sono e a malária, arriscando-se, depois de 1961, ao perigo constante ( 60% dos europeus vivia no interior ou diariamente o atravessava ), pois que, enquanto a tropa se deslocava em companhias ou pelotões, eles viajavam sozinhos e praticamente desarmados.

Os Portugueses de Angola, esses sim, é que eram colonizados e escravizados por Portugal!

ANGOLA E OS PORTUGUESES - III

Os Portugueses de Angola...que Portugal escravizava, ...porque embora fossem eles a ganhar os dólares, os marcos e as libras, pelas suas exportações, ...Portugal não lhos entregava!

O Fundo Cambial sugava a Moeda Forte e dava aos colonos “angolares”, que eram uma espécie de “vale” do escudo, mas com o cambio mais baixo e que só tinham valor lá na colónia.

Mais tarde inventou-se o escudo de Angola, com um valor ainda mais baixo que o antigo angolar. E era pagando nessa moeda que Portugal escravizava os seus colonos. Anos e anos a trabalhar e, no fim, o dinheiro não valia nada, pois que, para o trocarem, chegavam a descontar às vezes 50% ...e, mais tarde ainda pior....E por fim o seu valor era ZERO!

E desse modo, mesmo aqueles que, com muitos anos de África, queriam voltar, iam sempre ficando. E isso até à morte. ( Note-se que a média de vida em Angola era de uns bons 10 anos mais curta do que aqui na Metrópole ).

...É tambem verdade que 80 a 90% dos colonos de Angola não chegavam a ter esse problema, pois o que ganhavam só daria à recta para o seu dia-a-dia.

Mas, a pesar de tudo, os portugueses gostavam de lá viver. Modestamente, é verdade. Em Luanda não havia sequer uma residência de prestigio, como aqui em Portugal. As melhores casas, na Rua do Miramar, eram pertença de estrangeiros. Não existiam talvez nem 6 piscinas. Os automóveis eram conservados por 8 ou 10 anos,  e usavam-se pneus recauchutados. ...Mas os portugueses iam suportando tudo e mais alguma coisa   ( Até mesmo os massacres de 1961, quando 2 milhares  foram mortos, em 3 dias e a soldo estrangeiro, cortados em postas à catanada. No Kénia  o  mao-mao  tinha assassinado 85 ingleses em 5 anos e foi um escândalo mundial, mas 2.000 portugueses. em Angola, foi coisa sem importância nenhuma.)

...E, quando vinham de férias à Pátria ( Há uns tempos atrás a licença graciosa era de 5 em 5 anos), sentiam a maior satisfação ao ver as estradas, as pontes, as barragens, os hospitais e as escolas que aqui se iam construindo com os dolares e os marcos que eles lá iam ganhando.            ...E foi a esses portugueses, tão generosos e sacrificados, que, a troco dos tais angolares ou, muitas vezes, a troco de nada, sustentaram Portugal praticamente durante meio século, que a Pátria, sob o desvario dum momento até hoje inexplicável, ...traiu. ...Traiu quando lhes prometeu defender as suas vidas; ...traiu quando lhes garantiu salvaguardar os seus bens ...E traiu, por fim, quando o exército português lhes arrancou as armas ( de caça ou de defesa ) de que alguns dispunham, para as entregar ao tal “poder popular”, que os próprios partidos africanos diziam nem conhecer, e que era afinal formado por uma corja de bandidos e assassinos!

...E foi assim que se arquitectou a “trágica debandada”!

Recorde-se que em 1961, quando dos grandes massacres, a tropa branca reduzida aos 85 dragões do agora coronel José Maria Mendonça Junior, que salvou Luanda e ainda foi libertar os fazendeiros sitiados em Nambuangongo, e com a população completamente desarmada, ...ninguém arredou pé. E assim se mantiveram até ganhar a guerra em 1968 e a entregar Angola em 1975.        ...E o mais triste é que (14 anos depois) todo aquele descalabro se veio a desencadear, uns meses antes da independência, e ainda ao tempo da Soberania Portuguesa!

Foi a esses portugueses que, quando aqui chegaram, muitos deles feridos por espancamentos, com as roupas em farrapos e a angustia nos corações, até porque, em muitos casos, se haviam perdido das próprias famílias, que nem sabiam se mortas se vivas, ...que os seus gratos, reconhecidos irmãos da Metrópole olharam com desconfiança e baptizaram de “Retornados”.

...E ainda foi a esses que, mais tarde, quando se percebeu que todas as garantias que a Pátria lhes havia dado eram “pura conversa fiada” e que estavam reduzidos, de almas, corpos e haveres, a completos frangalhos, os seus compreensivos compatriotas de Aquém-Mar crismaram, espirituosamente, de “Espoliados”.

ANGOLA E OS PORTUGUESES - IV

Esta nossa democracia tem vantagens e desvantagens. ...O Voto, por exemplo, não será propriamente uma vantagem. O Voto é vulnerável, porque é influenciável ...e até manipulável. ...Pelo Voto ganha sempre a “Quantidade”. ...Nunca ganha a “Qualidade”.

Mas o “Deputado”, esse é uma vantagem, com certeza. É uma maravilha termos um Deputado que vai à Assembleia da República defender os nossos interesses, o Nada que ainda é nosso.

...Mas quando se pergunta a um português “Quem é o teu Deputado?” ...A resposta é infalível: “Sei lá! ...Não faço a menor ideia”.

Os tais “Espoliados” esperaram 25 anos para que um Deputado tivesse a coragem e a generosidade de ir à Assembleia da República explicar e defender a sua causa, que muita gente, “desonestamente”, quer esquecer. ...E quando, por milagre, apareceu esse Deputado, ( Um Homem, que afinal ainda havia ), com honestidade, inteligência e coragem para tentar a tal “missão ingrata”, e os Espoliados, depois de horas à chuva, se dispunham a entrar na “Casa de Todos Nós”, para assistir à defesa duma causa que só a eles dizia respeito, ...a Policia, ou quem mandava nela, ...impediu-lhes a entrada! ( Esse deputado foi o dr. Paulo Portas.)

...Isto deve, realmente, ser caso único na história das democracias! ...Mas foi verdade!.

...É tão vergonhoso que nem se suporta falar mais sobre o assunto! ...Adiante!

Para não nos espraiarmos muito mais, parece-nos que, pela série de razões atrás expostas, os portugueses de Angola, como de resto os de Moçambique, Guiné ou qualquer outra das “saudosas Provincias Ultramarinas”, têm que ser merecedores de todo o nosso respeito e consideração. ...E até mesmo da nossa gratidão, por tudo aquilo que sempre foram proporcionando a Portugal, enquanto lhes foi possivel.

...Em vez disso, só têm recebido incompreensão, antipatia e até troças.

Como foi possivel levar à televisão uma palhaçada em que se escarnecia dos espoliados? (Dela fez parte o jornalista Miguel Sousa Tavares, o que lamento). Até se chegou à conclusão de que eram os novos países ( Independentes ) que deviam pagar as indemnizações aos espoliados.  ...Então os grandes países europeus foram todos uns tansos quando indemnizaram os seus colonos?  Portugal assinou o Tratado de Versailles.  Esse tratado foi firmado após a 1ª Grande Guerra, claro, mas das suas cláusulas emanaram Leis que continuam, em muitos exemplos, a ser respeitadas e seguidas. ...E naturalmente até a vigorarem. É favor ler com atenção o seu Artigo nº 297, que define exactamente a responsabilidade nos casos de descolonização por guerra.              E o mal não foi a descolonização.  Não é dela que os retornados se queixam.   …Inconcebível e estúpido é o modo como foi feita, e a desastrosa espoliação que consentiu ou que, até mesmo, encorajou. ...De resto não reconheceu o Estado Português essa responsabilidade ( E essa divida ) quando foi criado o “Gabinete dos Espoliados” ? ...Possivelmente já dissiparam as verbas com que esta sagrada e escandalosa divida deveria ter sido paga.     Mas o problema é de tal modo grave que, agora sim, se justifica recorrer à Banca Estrangeira! ...Ou, em ultimo caso, que se pague em Titulos do Tesouro do Estado, ou em quaisquer outros Valores Nacionais. Desse modo não teriam que ser desembolsa-dos a pronto os montantes da divida. Iriam pagando os juros respectivos e resgatando parceladamente esses Titulos....Seriam assim repostas a justiça e a legalidade, ao mesmo tempo que decerto se garantiria, pela mão competente dos retornados, uma aplicação honesta e inteligente desses capitais, ...em vez do costumeiro desperdício!

J. SÁ-CARNEIRO                                         

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

A OPÇÃO IBÉRICA - VI Ainda 4 pequenos subsídios

IBÉRIA ? ...OU  HISPÂNIA?  VI     -    ( Ainda a União)

                                                                      ( Memória – Nov.  2002 )

1 - A LINGUA - Depois que os romanos abandonaram a Peninsula, o Latim Bárbaro, que que cá deixaram, tendeu, pouco a pouco, a transformar-se numa nova lingua, que podemos considerar comum a quase todos os povos Ibéricos, e que se chamou “Romanço” (Tendo tomado os nomes de “romance”  e  “romansh” noutras regiões da Europa romanizada).

Na Ibéria, esta nova lingua, por sua vez, acabou por se dividir numa série de dialectos:

O Catalão, o Castelhano, o Galego, etc. ( O Basco nada tinha a ver com o romanço, sendo antes o unico dialecto que restava, e resta, dos primitivos Iberos ).

Porque Castela se revelou rapidamente o mais dinâmico e combativo dos reinos peninsulares, o castelhano acabou por se tornar a lingua geral, embora se tenham mantido os dialectos locais.

Os primeiros “portugueses”, dado que o Condado foi originado da parte sul da Galiza, como é natural, falavam o galego. Mas, depois da separação, com o contributo moiro, e o correr dos anos, acabou por vir a formar-se um novo Dialecto (Ou Lingua, se preferem): O Português. Infelizmente, embora a nossa Lingua seja hoje falada por cerca de 200 Milhões de lusófonos, não foi ela aceite como lingua da União Euopeia. ...Mas o Castelhano sim!.

Mais: A OMC - Organização Mundial do Comércio - e a OMA - Organização Mundial das Alfândegas, os dois organismos mais importantes do Comércio Internacional, optaram por unicamente quatro (4) linguas: O Inglês, o Francês, o Castelhano (Ou Espanhol) e o Russo.

...Não o Alemão, nem o Italiano, ...nem o Português.

Põe-se agora um problema: Claro que Portugal, como tem sido moda desde a ultima Guerra Mundial, escolhe imediatamente o Inglês como Lingua Internacional!    ...Mas tal poderá ser um tremendo erro!                                                                                                      

...Porque a verdade é que, embora toda a gente consiga falar “um bocadinho” de Inglês, pode assegurar-se que 99% desses “anglófonos” o falam pessimamente,    ...e muito menos o escrevem. Uma coisa é perceber as letras das canções, ou namorar na praia, ou até mesmo escrever pequenas cartas de baixo comércio.    ...Outra coisa é dominar essa lingua, que nem sequer tem o apoio duma verdadeira gramática, ao nivel das nuances da redacção de importantes e “arriscados documentos politicos”, ou dos “altos comércio e finança internacionais”.                                                                                                       ...Todavia a grande maioria dos portugueses seria capaz de, com a necessária propriedade, e até relativa   facilidade,   ...falar o Espanhol !

...E assim já disporíamos, automaticamente, duma 2ª Língua, verdadeiramente Internacional

...E claro que seria óptimo que muitos deles pudessem tambem continuar a falar o Inglês.

2 - Um PARTIDO UNIONISTA IBÉRICO ( Partido de Transição)

Com os aflitivos apertos que se avizinham, parece-me ser mais do que a altura para que este partido seja formado! Não há nisso o menor inconveniente, nem se torna perigoso para nin-guem. ...Que não haja medo! ...Pois que nem mesmo sob os Filipes perdeu Portugal a sua identidade. ...E numas próximas eleições se verá qual a verdadeira vontade dos Portugueses

...Ainda hoje ouvi, num debate televisivo, alguem dizer que o volume e impacto que teria na Europa, e no Mundo, um Mercado de 50 Milhões (De produtores e consumidores) seria algo muito diferente do dos pálidos 10 Milhões que hoje  sozinhos)  somos!

...E há ainda a considerar a resultante projecção sobre os 160 milhões de brasileiros e os mais de 400 milhões dos outros latino-americanos.

3 - Um PARTIDO MONÁRQUICO ( Que poderá ser, ou não, o existente ).

O qual teria como seu primordial objectivo conseguir rectificar a Constituição, substituindo

“Eleição para Presidente da República” por “Eleição para Chefe do Estado”, podendo assim concorrerem, alem dos Candidatos Republicanos, tambem os Candidatos Monárquicos (Bragança e Bourbon, ...e mesmo outros).

Nota: Continuamos a considerar que os Partidos Monárquico e Republicano ( ...ou Democrático – seu sinónimo ) são Partidos de Estado. ...Nunca Partidos de Governo.)

Os Socialismo, Fascismo, Liberal-capitalismo, etc. é que são partidos de Governo.

4 – “AVISO À NAVEGAÇÃO”

Face às noticias, que todos os dias nos chegam em catadupa, pela TV, Jornais, Revistas, etc.     da instalação em Portugal dos grandes “shopings” espanhóis, de fusões e parcerias comerciais de toda a espécie, e absorção de Bancos e Seguros pelos seus congéneres do lado de lá,   não será de começar a temer ficarmos em breve reduzidos aos encargos e despesas de Governo e de Administração Nacionais, sem a contrapartida de lucros comerciais de qualquer espécie, ou até mesmo do pagamento de variados serviços ?

...Não seria preferível tomarmos nós a iniciativa desse inevitável “casamento”?

Cascais, 2002. Nov. 02

J. Sá-Carneiro